segunda-feira, 30 de maio de 2011

Toda religião é uma forma de preconceito



"Se o Ronaldo pegou, então deve ser irado!"

Comentário do meu amigo Daniel, corintiano, a respeito da suposta aventura sexual de Ronaldo Fenômeno com travestis

Outra mentirinha que o povo culturalmente confortável com a cultura brasileira criou para enganar a si mesmo, auxiliado por específicos meios de comunicação, órgãos do governo e pela intrépida burrice que lhe é característica principal, é a de que todo tipo de preconceito foi erradicado da nossa evoluída sociedade. O dia em que isso acontecer, e não me refiro somente ao nosso arrombado país, mas ao mundo todo, será o dia em que um E.T anunciar, em árabe, a nossa extinção. O preconceito é inerente ao ser humano. Se não houvesse preconceito, não haveria humor. O preconceito é a matéria-prima do humor. Se há pessoas desprovidas de preconceito, eu não as conheço. As pessoas desprovidas de preconceito que conheço são as hipócritas. Vi uma reportagem na televisão que o número de cirurgias de redução no estômago em crianças alcançou níveis nunca vistos no país. O crescimento dessas intervenções ocorreu por conta do termo mais babaca para designar algo provocado por babacas mais babacas que o termo: o Bullying. Eu sofri essa porra quando era criança. E, por incrível que pareça, aprendi muitas coisas que tornaram a existência cotidiana menos torturante. A principal delas foi a de que as pessoas não mudam. Pode-se dissimular o mal se a pessoa for uma filha da puta. Pode-se dissimular a inveja se a pessoa for invejosa. Pode-se dissimular a falta de senso de humor se a pessoa for comunista: a essência perdura e desnuda-se quando a casa cai. O Bullying é a forma mais brutal de preconceito e a mais vil. Já que o preconceito é inerente a nosotros, devemos usá-lo com inteligência. A vida é feita de escolhas, cada escolha é um preconceito. Preferir alguém a outrem denota preconceito. Torcer por um time: preconceito. Organizar um set list no Ipod: preconceito. A existência nada mais é que uma variedade de preconceitos com múltiplos significados. O preconceito que revolve, com violência, opções sexuais e raça é o preconceito da torpeza.
Aprendi muitas coisas que tornaram a existência cotidiana menos torturante. A principal delas foi a de que as pessoas não mudam. Se a pessoa for boa, ela usará o preconceito de modo inteligente. Se for má, ela usará o preconceito para promover guerras. Se for burra, ela achará que está livre de preconceitos.

Então eu era magro e dentuço e às vezes aquele mundo tinha gosto de sangue.
E as meninas ainda não tinham peitos e eu não tinha peito para chegar às meninas.
E, embora com o passar do tempo os peitos de todas as meninas foram crescendo, o meu peito para chegar às meninas ficou do tamanho dos seios de uma ginasta.
Portanto agora eu poderia atribuir essa falta de coragem ao soco na cara que recebi de alguns filhos da puta da quarta a sexta série.
E também poderia abusar desse artifício cômodo para justificar as duas repetências dessa fase incômoda.
Poderia me isolar em minha saga de saco de pancadas cheio de porra amotinada no meu saco. Poderia me alimentar de ódio e vomitar uma enxurrada de sangue tsunâmico e pedaços de dentes negligenciados enquanto tentava proferir a palavra amor em bolhas coloridas.
Poderia deixar de usar desodorante e cuspir no próprio rosto para chocar a patota que chocava a minha cabeça contra a parede.
Era assim que poderia ter sido o futuro.
Era assim que poderia começar a desmembrar animais de estimação.
Filhotes, de preferência.
Crianças, de preferência.
Derramar sangue alheio para recuperar o sangue perdido.
Transfusão histórica.
Derramar o sangue alheio para recuperar as noites de sono que perdi.
Era assim que poderia perder tempo remoendo o tempo perdido.
Mas não.
Havia outro mundo para conhecer.
Ainda bem que só pessoas boas faziam parte dele.
Ainda bem que só pessoas boas fazem parte do presente que me dei.

Todo homem é um preconceito em si mesmo

Eu me dou bem com os gays. Na real, eu sempre me dei bem com os gays. Não, eu nunca dei para gays nem para qualquer cidadão que possua pênis. Sou preconceituoso o bastante para impossibilitar que qualquer coisa toque o meu cu. Mas não tenho nada contra, inclusive até conheço, gente que deixa a namorada lamber o próprio cu. A liberdade autônoma pode ser mais subjetiva do que pregam. Ela fez com que um amigo fosse duas vezes a uma balada gay só para ver como é que era. O nome da balada: Santa Mix. O nome do amigo: deixa pra lá. Desde criança vivo num mundo habitado relativamente por gays. Quem vive atualmente na cidade de São Paulo, também. Dos quatro anos até os 13, eu quis ser jogador de futebol. Mas, como sempre, desencanei. E novamente desencanei quando, dos 14 aos 23, quis ser um rockstar. Depois quis ganhar dinheiro escrevendo as coisas que gosto: isso. Ainda continuo a escrever as coisas que gosto, mas o dinheiro não gosta das coisas que escrevo. E eu não gostaria de ganhar dinheiro escrevendo coisas que não gosto. Como nunca namorei garotas que não gosto. Contudo, estar em um lugar que desgoste nem sempre é uma questão de escolha. A liberdade pode, às vezes, desiludir. O problema, porém, é que não há escolha para quem não tem dinheiro. Ou melhor, tem, e ela envolve comer merda e foder uma gorda fedida que fala sozinha em cima de um monte lixo. Então tive que me contentar em obter dinheiro trabalhando no negócio da família. Em certos casos, a única escolha que se tem é escolher a falta de escolha: jogar o dardo na direção do alvo, errar o alvo e rezar para que ele não retroceda e perfure a nossa testa. O meu pai deve ter pensado desse modo ao me apresentar, durante o período da infância, o tão propalado e temido período da formação, somente o lado macho da vida. Certamente deve ter sido difícil para um homem de 34 anos, que acabara literalmente de pendurar as chuteiras, aceitar a idéia de passar o resto de sua vida administrando uma escola de ballet. É isso que ele, junto com a minha mãe, faz há 28 anos. 28 anos de sapatilhas, músicas ao piano e homens depilados de voz fina. É isso que ele, junto com a minha mãe e, nos últimos dois anos, junto com o filho, faz há 28 anos. A relação do homem com a prática do ballet é baseada na coragem e na desconfiança alheia de uma suposta homossexualidade. Quantas vezes você já ouviu: “Não é porque ele faz ballet que ele é gay”. Por experiência própria, de 20 bailarinos que conheci, o dedo mindinho do pé de um deles não era gay: estava com o esmalte gasto, um horror! Ser gay, pelo menos para alguns, não significa ser gay o tempo todo. Ninguém suporta por muito tempo ficar ouvindo o Marinho discorrer sobre toca-discos, vinis e dj’s. As mulheres, certamente, não! O homem só agüenta a mulher cujo monólogo está restrito a glamour, fofocas e roupas quando sabe que o seu laborioso papel de ouvinte propiciará que ele a leve para o banco de trás do carro e a coma de quatro enquanto a bochecha dela fica engraçada ao ser esfregada no vidro. Agora, como pedir para um heterossexual que agüente o papo com um homem cujo repertório vocabular se restringe a picas grossas, peitos peludos, Lady Gaga, picas grossas, rabos peludos, Scissor Sisters, picas grossas e a bunda depilada do príncipe William? E como pedir para um homossexual que tolere o papo com um homem cujo repertório vocabular limita-se a homens de coxas grossas que correm atrás de uma bola, esquemas táticos incompreensíveis que envolvem esses mesmos homens de coxas grossas correndo atrás da mesma bola, homens musculosos banhados em sangue engalfinhados em uma gaiola estendida, donas de bucetas sacanas, donas de bucetas recatadas e pena de morte? Ser gay não significa não ser homem, significa ser um homem com predileções distintas da maioria dos homens. Entretanto, por mais discrepantes que sejam essas predileções, sempre há coisas em comum. (Não, não estou me referindo a uma análise do dilema Richarlyson.) Por exemplo, Scissor Sisters. Eu curto Scissor Sisters. E daí? Qual é a diferença entre Scissor Sisters e Bee Gees? Tudo bem, o vocalista do Scissor Sisters rebola pra caralho, mas fora esse sacolejante detalhe, qual é o problema? Exaurido o assunto Scissor Sisters, que tal abordar Erasure? Assumo, também gosto de Erasure, considero A Little Respect uma grande canção pop - e não posso ser contrário à análise de que a maior parte dos homens que assumiram que curtem Erasure mais cedo ou mais tarde assumiram-se boiolas. Mas sou exceção. Sempre há uma exceção em homens que familiarizam-se com aspectos da cultura gay. Alguém deixou de ler e respeitar Gore Vidal por conta disso? Embora não há um ser no meu círculo de amizades que leu ou lerá Gore Vidal. (Talvez se interesse no futuro, vai saber, por algo escrito por Al Gore.) Há homens heterossexuais que vislumbram bravura no ato da sodomia masculina. “Porra, um cara que agüenta um pau de negão de 30 centímetros e, ainda por cima, ou por baixo, sente prazer no ato, tem que ser muito macho!” Sério? Acredito que o homem cujo bumbum agüenta um pau de negão de 35 centímetros, e ainda sente prazer no ato, tem que ser muito gay. Ser gay nada mais é que agüentar um pau de 49 cm e ainda sentir prazer no ato. O gay só é gay porque gosta de currar e ser currado por homens. Ninguém é gay só pelo fato de gostar de Patrícia Marx. Ok, me rendo, antes de fazer a pergunta a si mesmo, admito, gosto de Patrícia Marx, Quando Chove é uma música que toca profundamente o meu coração, não só o meu coração mas o coração e o cóccix de dez décimos da Parada Gay. Tanto Patrícia Marx quanto Bryan Adams – é, ele também -, Wilson Phillips (não conhece? Corra atrás. Sonzeira bem... de boa), Boyz II Men (Wesley Snipes ouve Boyz II Men quando está com o coração partido, tá!), The The (resumo: o Deus da música), Banda Beijo (peguei pesado, né? Eu sei, mas Baianidade Nagô é uma música que inexplicavelmente me faz cantar, eu sei a letra toda, cara, é uma vergonha, esse momento é um divisor de águas na minha biografia, nunca contei a ninguém, vocês são as primeiras pessoas a que conto, vocês... três leitores que leem esta porra!), Dionne Warwick (meu brother, se você não derrama nem uma mísera lágrima toda vez que ouve That’s What Friends Are For, você tem um cacto moribundo no lugar do coração), 4 Non Blondes (todo mundo se achava “cool” ou “cuuullll” ao cantar What’s Up!) e... Zélia Duncan (não vomite, senão vou vomitar, depois desta última “surpresinha”, mereço vomitar na minha própria cara!) me impelem a lembrar de uma época que o significado da palavra “relaxar” era tomar banho de banheira sozinho (só para constar, não pegava ninguém), ouvir rádio FM (entendeu?) e criar um estratagema para extravasar o amor que sentia por Renata Yumi (ainda não tinha “me” inventado a punheta). Na boa, eu tinha 11 anos e não tinha controle nem sobre o meu corte de cabelo, como vocês dois podem exigir uma “maior” qualidade no meu gosto musical pré-adolescente? “Fale por você, carinha, eu, quando tinha 9 anos, veja só, 9 anos, já escutava John Cage.” Ouvia o quê, 4’33”? Não fode, caralho, com 9 anos to ligado que tu escutava Copacabana Beat trancado no quarto e possuía a latinha das 7 Melhores da Pan. Tão vendo? Este é o problema do homem que está mais próximo da meia-idade e mais distante do saudoso período em que tinha meio-metro e nem meia-preocupação com a vida e nem meia-obrigação de correr atrás de meia-entrada para dormir no meio do filme: ele esconde o passado púbere como se fosse o Phil Anselmo antes do Pantera ser O Pantera.

4 comentários:

Ana Paula disse...

Se liga cara eu também leio essa porra! Graças ao Rodrigo França Silva do facebook.Adoro o jeito que você escreve, parabéns!

Ana Paula disse...

Eu curto como você coloca musica em tudo que escreve, quando fala de suas historias e quando fala de lugares aqui do Guqrujá.

Karen disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Karen disse...

Meu, eu também leio esse negócio. E a culpa é sua, que me deixou o link no quase-extinto-pero-falido orkut. Isso tudo não sei como. Mas me divirto.